quarta-feira, 26 de março de 2008
Ensaios 19, 20 e 25 de marco
Semana de buscar novos horizontes dentro de um universo já conhecido. Se na semana passada a questao que me inquietava era descobrir se as energias tinham uma vida própria, independente do texto que as tinha gerado, essa semana me proprus a testar os limites dessa independência, e até que ponto era possivel moldar uma dessas energias a partir de uma referência externa.
Primeiro trabalhei duas das energias, utilizando um trecho específico do texto como referência para a improvisacao. A idéia era contaminar a danca, agora independente, da energia da Else, e ver qual o resultado. Curiosamente, descobri que algumas energias existem muito fortemente independentes do texto, porque elas sao projecoes menos concretas da personagem como um todo, sendo imagens complexas de um detalhe de sua personalidade. Por exemplo, trabalhando a sedutora, percebi que ela é um aspecto da personalidade de else que aparece quando ela é colocada em pressao por Dorsday, e comeca a se questionar sobre atitudes que até entao simplesmente seguia por obrigacao social. Porém, essa energia corporificada vai muito além desse questionamento, é uma energia forte, adulta, segura de si, uma energia que em nenhum momento pode ser, independente, comparada com a personalidade de Else. Isso vence um problema, que era o medo de estar me atendo demais a um universo, e me leva à constatacao de que estou conseguindo meu maior objetivo, que era usar esse uzniverso como estímulo, nunca como limite...
Trechos de texto utilizados:
Libertina: "Ter vergonha de vocês? De alguém? Imagine. Olho mais uma vez no fundo dos seus olhos, linda Else. Como seus olhos sao grandes, quando vistos de perto. Queria que alguém me beijasse nos olhos, nos meus lábios vermelhos. Meu casacao nao cobre o pé. Verao que estou descalca. Nao importa, verao muito mais, linda. Mas nao sou obrigada a fazê-lo (...) Nao preciso absolutamente ir lá embaixo. Mas quero ir. Me agrada a idéia. Nao desejei isso durante toda a minha vida?" (pag. 79)
Romântica: "Se pudesse fazer uma mágica, queria ir para o lugar mais longe do mundo. Era um barco lindo, no mediterrâneo, mas nao sozinha. Com Paul, por exemplo. Ou poderia morar em uma vila na beira do mar... Nós nos deitaríamos nos degraus de mármore, que desceriam até a aágua, ele me prenderia fortemente em seus bracos, e me morderia os lábios, como Albert fez, há dois anos, junto ao piano, aquele cara insolente. Nao. Gostaria de estender-me sobre o mármore e esperar. E finalmente chegaria um, ou vários homens, e eu poderia escolher, e os demais rejeitados se precipitariam no mar, desesperados. Ou teriam que ser pacientes e esperar o dia seguinte. Isso é que seria uma vida deliciosa. Senao, pra que tenho esses ombros soberbos e lindas pernas esguias?" (pag. 60)
Depois disso, selecionei apenas a energia da Libertina e sete imagens do klimt. Trabalhei primeiramente com a mímesis das imagens, depois comecei a improvisar tentando combinar as imagens, os elkementos que eu já tinha e a energia da libertina. Ainda é um trabalho em processo, algumas imagens parecem ter encontrado um lugar dentro da improvisacao, outras parecem ainda bruscas, como se eu interrompesse a improvisacao pra conseguir chegar a imagem, sinto que o fluxo da energia se quebra com mais facilidade, por outro lado isso tem me levado a buscar novas possibilidades de movimento, novos detalhes dentro da energia, que tem compensado o trabalho. Nao sei se todas as imagens vao servir para o trabalho, nao sei até que ponto devo me manter apoiado nelas, ou deixar que se transformem na improvisacao. Mas tem sido um trabalho interessante, e pretendo explorá-lo até seus limites.
Por fim, ontem realizei uma improvisacao com o objetivo de recuperar as quatro energias e colocá-las dentro de uma estrutura dramaturgica simples. Para isso, me utilizei novamente da srta else, e fiz uma impro: a danca da romântica, leitura da carta da mae de else, durante essa transformacao da energia da romantica pra do desespero; danca do desespero, alternada com momentos de quebra da romantica; aparicao da energia da desilusao, com pequenas quebras da romântica ou desespero; desilusao - o caminho até o quarto de Dorsday; danca da sedutora/exibicionismo; desespero - esconder o corpo; desespero/feto - estupro; desilusao - volta pra casa. Penso em manter um pouco essa estrutura como primeira estrutura de trabalho, pra poder me aprofundar em seus momentos, porque sinto que só toquei a superficie de alguns momentos. Me parecem especialmente interessantes as passagens entre desespero e desilusao (especialmente a do final), a impro conjunta de desespero e romântica, além dos já mais conhecidos estupro e exibicionismo da sedutora.
Primeiro trabalhei duas das energias, utilizando um trecho específico do texto como referência para a improvisacao. A idéia era contaminar a danca, agora independente, da energia da Else, e ver qual o resultado. Curiosamente, descobri que algumas energias existem muito fortemente independentes do texto, porque elas sao projecoes menos concretas da personagem como um todo, sendo imagens complexas de um detalhe de sua personalidade. Por exemplo, trabalhando a sedutora, percebi que ela é um aspecto da personalidade de else que aparece quando ela é colocada em pressao por Dorsday, e comeca a se questionar sobre atitudes que até entao simplesmente seguia por obrigacao social. Porém, essa energia corporificada vai muito além desse questionamento, é uma energia forte, adulta, segura de si, uma energia que em nenhum momento pode ser, independente, comparada com a personalidade de Else. Isso vence um problema, que era o medo de estar me atendo demais a um universo, e me leva à constatacao de que estou conseguindo meu maior objetivo, que era usar esse uzniverso como estímulo, nunca como limite...
Trechos de texto utilizados:
Libertina: "Ter vergonha de vocês? De alguém? Imagine. Olho mais uma vez no fundo dos seus olhos, linda Else. Como seus olhos sao grandes, quando vistos de perto. Queria que alguém me beijasse nos olhos, nos meus lábios vermelhos. Meu casacao nao cobre o pé. Verao que estou descalca. Nao importa, verao muito mais, linda. Mas nao sou obrigada a fazê-lo (...) Nao preciso absolutamente ir lá embaixo. Mas quero ir. Me agrada a idéia. Nao desejei isso durante toda a minha vida?" (pag. 79)
Romântica: "Se pudesse fazer uma mágica, queria ir para o lugar mais longe do mundo. Era um barco lindo, no mediterrâneo, mas nao sozinha. Com Paul, por exemplo. Ou poderia morar em uma vila na beira do mar... Nós nos deitaríamos nos degraus de mármore, que desceriam até a aágua, ele me prenderia fortemente em seus bracos, e me morderia os lábios, como Albert fez, há dois anos, junto ao piano, aquele cara insolente. Nao. Gostaria de estender-me sobre o mármore e esperar. E finalmente chegaria um, ou vários homens, e eu poderia escolher, e os demais rejeitados se precipitariam no mar, desesperados. Ou teriam que ser pacientes e esperar o dia seguinte. Isso é que seria uma vida deliciosa. Senao, pra que tenho esses ombros soberbos e lindas pernas esguias?" (pag. 60)
Depois disso, selecionei apenas a energia da Libertina e sete imagens do klimt. Trabalhei primeiramente com a mímesis das imagens, depois comecei a improvisar tentando combinar as imagens, os elkementos que eu já tinha e a energia da libertina. Ainda é um trabalho em processo, algumas imagens parecem ter encontrado um lugar dentro da improvisacao, outras parecem ainda bruscas, como se eu interrompesse a improvisacao pra conseguir chegar a imagem, sinto que o fluxo da energia se quebra com mais facilidade, por outro lado isso tem me levado a buscar novas possibilidades de movimento, novos detalhes dentro da energia, que tem compensado o trabalho. Nao sei se todas as imagens vao servir para o trabalho, nao sei até que ponto devo me manter apoiado nelas, ou deixar que se transformem na improvisacao. Mas tem sido um trabalho interessante, e pretendo explorá-lo até seus limites.
Por fim, ontem realizei uma improvisacao com o objetivo de recuperar as quatro energias e colocá-las dentro de uma estrutura dramaturgica simples. Para isso, me utilizei novamente da srta else, e fiz uma impro: a danca da romântica, leitura da carta da mae de else, durante essa transformacao da energia da romantica pra do desespero; danca do desespero, alternada com momentos de quebra da romantica; aparicao da energia da desilusao, com pequenas quebras da romântica ou desespero; desilusao - o caminho até o quarto de Dorsday; danca da sedutora/exibicionismo; desespero - esconder o corpo; desespero/feto - estupro; desilusao - volta pra casa. Penso em manter um pouco essa estrutura como primeira estrutura de trabalho, pra poder me aprofundar em seus momentos, porque sinto que só toquei a superficie de alguns momentos. Me parecem especialmente interessantes as passagens entre desespero e desilusao (especialmente a do final), a impro conjunta de desespero e romântica, além dos já mais conhecidos estupro e exibicionismo da sedutora.
quarta-feira, 12 de março de 2008
Ensaio 12 de Marco
Toda energia tem um ponto de origem, uma fonte, mas nao pode se limitar a ela. Ela só comeca a existir como corpo consistente quando abstrai o lugar de onde nasceu e passa a existir corpórea e sensorialmente livre das barreiras de uma imagem, ou um texto, ou uma memória... Quando ela passa a existir em si, quando ela pode ser trabalhada, resgata, moldada de acordo com as nossas vontades.
Esse foi o grande foco do ensaio de hoje. Dancar cada energia de forma abstrata, esquecer por alguns instantes o Srta Else, a sensacao de exibicao do corpo, as pequenas relacoes já estabelecidas que me conduziam a acoes concretas e de certa forma pré-determinadas (como na semana passada, ainda que improvisadas, mas sobre uma abóboda coerente) e simplesmente dancar cada energia, compreendê-la nao como imagem, mas como sensacao, como desenho no espaco, como tonus do corpo, como qualidade independente. Esse passo é ao meu ver fundamental para que eu possa ir alé, para que surjam novas possibilidades, novos desafios, novas combinacoes...
A Romantica apareceu com um vigor até entao inexplorado, trabalhei com a presenca de um objeto abstrato (um pano preto), que me provocou novas e inusitadas qualidades de movimento, cada vez mais ela se caracterisa como uma energia rápida e flexível, acima de tudo leve... O desespero, por sua vez, tem o tonus como um elemento fundamental. Nele ainda me sinto muito preso a determinado tipo de postura, porém no final da improvisacao comecaram a aparecer momentos interessantes, especialmente com a exploracao de espasmos rápidos e repetidos dentro da qualidade de extrema tensao. A sedutora também ganhou muito em presenca, em desenvolvimento no espaco, é de alguma forma a energia da donzela, porém adulta, madura, segura do seu poder de seducao. A concubina... A desilusao ainda é para mim o estado mais engmático. Primeiro busquei o esvaziamento e foi muito dificil dancá-lo. Cada movimento que surgia parecia trazer já uma emocao em si, e o esvaziamento acaba perdido a cada vez que tentava me movimentar (um problema com o qual já me defrontei outras vezes em energias semelhantes). Por isso trouxe uma característica do texto que é ao meu ver fundamental para a criacao dessa personagem: a necessidade de ir adiante, mesmo com o vazio interior, ou uma aparencia de placidez recheada de sensacoes. Com essas duas idéias consegui ir mais adiante, mas mesmo assim nao foi uma improvisacao simples.
Uma outra questao parece me preocupar: a música comeca novamente a ter um papel importante dentro do desenvolvimento das improvisacoes, a escolha da música certa, ou do silêncio... Considerando minha opcao de montagem, na qual tudo aconteceria explicito em cena, nao haveria nenhum operador externop, tenho que pensar como lidar com isso. Se a música vai ter esse papel, e eu vou ter que encontrar uma solucao cenica para sua incursao (ou desistir dessa idéia e ter um operador externo), ou se eu preciso pensar a construcao separada de um uso musical, e nesse caso vou trabalhar muito com a ideia do silêncio...
Esse foi o grande foco do ensaio de hoje. Dancar cada energia de forma abstrata, esquecer por alguns instantes o Srta Else, a sensacao de exibicao do corpo, as pequenas relacoes já estabelecidas que me conduziam a acoes concretas e de certa forma pré-determinadas (como na semana passada, ainda que improvisadas, mas sobre uma abóboda coerente) e simplesmente dancar cada energia, compreendê-la nao como imagem, mas como sensacao, como desenho no espaco, como tonus do corpo, como qualidade independente. Esse passo é ao meu ver fundamental para que eu possa ir alé, para que surjam novas possibilidades, novos desafios, novas combinacoes...
A Romantica apareceu com um vigor até entao inexplorado, trabalhei com a presenca de um objeto abstrato (um pano preto), que me provocou novas e inusitadas qualidades de movimento, cada vez mais ela se caracterisa como uma energia rápida e flexível, acima de tudo leve... O desespero, por sua vez, tem o tonus como um elemento fundamental. Nele ainda me sinto muito preso a determinado tipo de postura, porém no final da improvisacao comecaram a aparecer momentos interessantes, especialmente com a exploracao de espasmos rápidos e repetidos dentro da qualidade de extrema tensao. A sedutora também ganhou muito em presenca, em desenvolvimento no espaco, é de alguma forma a energia da donzela, porém adulta, madura, segura do seu poder de seducao. A concubina... A desilusao ainda é para mim o estado mais engmático. Primeiro busquei o esvaziamento e foi muito dificil dancá-lo. Cada movimento que surgia parecia trazer já uma emocao em si, e o esvaziamento acaba perdido a cada vez que tentava me movimentar (um problema com o qual já me defrontei outras vezes em energias semelhantes). Por isso trouxe uma característica do texto que é ao meu ver fundamental para a criacao dessa personagem: a necessidade de ir adiante, mesmo com o vazio interior, ou uma aparencia de placidez recheada de sensacoes. Com essas duas idéias consegui ir mais adiante, mas mesmo assim nao foi uma improvisacao simples.
Uma outra questao parece me preocupar: a música comeca novamente a ter um papel importante dentro do desenvolvimento das improvisacoes, a escolha da música certa, ou do silêncio... Considerando minha opcao de montagem, na qual tudo aconteceria explicito em cena, nao haveria nenhum operador externop, tenho que pensar como lidar com isso. Se a música vai ter esse papel, e eu vou ter que encontrar uma solucao cenica para sua incursao (ou desistir dessa idéia e ter um operador externo), ou se eu preciso pensar a construcao separada de um uso musical, e nesse caso vou trabalhar muito com a ideia do silêncio...
sexta-feira, 7 de março de 2008
Ensaio 05 e 07 de Marco
Qual é o corpo ideal pra criacao? Como trazer cada corpo pra um estado efervescente, criativo, ativo? Essa foi uma pergunta extremamente presente nessa semana. Os ensaios aconteceram em condicoes muito distintas, e como fazer o melhor em cada uma dessas condicoes foi um exercício que eu me propus, dentro da linha estabelecida de escutar mais o corpo e preparar menos o roteiro de trabalho. Na quarta eu tinha dormido pouco, mal, me senti cansado e com dores... Na sexta ensaiei a tarde, tinha dormido bem, estava com o corpo relativamente inteiro e pronto pro trabalho. Seria de se concluir automaticamente que o ensaio de sexta seria infinitamente superior ao de quarta? Ou um corpo cansado tenderia à exausatao e seria mais facilmente sensibilizável do que um corpo descansao (sempre me fiz essa pergunta, diga-se de passagem...)
Pois é, continuo sem respostas... O corpo descansado trabalhou com mais facilidade que o cansado, mas nao trouxe resultados necessariamente melhores. O corpo exausto por sua vez, criou grandes estados emocionais, mas o relaxamento e a atencao do corpo descansado produziram resultados igualmente sensíveis...
Essa semana retirei um conceito de Srta Else e trabalhei as quatro energias a partir dele. A idéia de exibicao do corpo foi o mote para uma improvisacao definida em quatro momentos: entrada num salaso cheio de pessoas, desnudamento, relacao sexual e reverberância no corpo. Claro que essas imagens eram interiores, que os movimentos nao eram necessariamente representativos, mas a presenca de uma pequena e básica dramaturgia possibilitou a conducao do trabalho e o aprofundamento em diferentes facetas de uma mesma energia. Foram muitas descobertas em duas horas, todas as energias aconteceram plenas, criativas, intensas. Aproveitando-me disso na sexta retomei cada energia de forma curta, individualmente, e depois trabalhei em cima do mesmo roteiro, mas com uma transformacao de energias: uma improvisacao comecava na libertina e terminava no desespero e a outra comecava na desilusao e terminava na romantica. Os mresultados também foram muito interessantes, porque uma energia, se bem utilizada, pode impulsionar o surgimento da outra de forma plena. De maneira geral, a primeira impro funcionou melhor que a segunda, até porque eu já estava próximo do final do ensaio e acabei correndo um pouco. Mas ficou claro que os paradoxos e as relacoes entre as quatro energias sao muito mais profundas e complexas do que eu tinha estabelecido a principio. o desespero, por exemplo, se conecta profundamente com a desilusao (como um centro impulsionador), m,as por outro lado apresenta contrastes interessantes com a romântica, porque uma vive o futuro e outra o passado.
O desespero, alias, ganhou contornos novos e mais profundos nessa semana. De alguma forma ele se descola da Else, mas eu nao vejo problemas obrigatoriamente nisso. Na quarta, a ideia da relacao sexual e o desespero conjuntamente trouxeram a volta de uma energia que hibernava há uns quatro anos, que eu tinha denominado de estupro. Nessa conexao, foi inevitável ver o ato sexual como algo repugnente, doloroso, contra a propria vontade. Na sexta, talvez influenciado por uma figura de Klimt que tinha visto por acaso pouco antes do ensaio (que anexo aqui) durante uma impro livre levei a mao à barriga, e me veio imediatamente a imagem de uma gravidez indesejada. Isso da mais uma nova perspectiva pra olhar essa energia, ela cada vez mais perde a imagem da menina oprimida por padroes sociais, e da uma dimensao mais profunda e grotesca pra essa opressao. Isso me agrada. Só como curiosidade, a obra de Klimt se chama A Esperanca...
Pois é, continuo sem respostas... O corpo descansado trabalhou com mais facilidade que o cansado, mas nao trouxe resultados necessariamente melhores. O corpo exausto por sua vez, criou grandes estados emocionais, mas o relaxamento e a atencao do corpo descansado produziram resultados igualmente sensíveis...
Essa semana retirei um conceito de Srta Else e trabalhei as quatro energias a partir dele. A idéia de exibicao do corpo foi o mote para uma improvisacao definida em quatro momentos: entrada num salaso cheio de pessoas, desnudamento, relacao sexual e reverberância no corpo. Claro que essas imagens eram interiores, que os movimentos nao eram necessariamente representativos, mas a presenca de uma pequena e básica dramaturgia possibilitou a conducao do trabalho e o aprofundamento em diferentes facetas de uma mesma energia. Foram muitas descobertas em duas horas, todas as energias aconteceram plenas, criativas, intensas. Aproveitando-me disso na sexta retomei cada energia de forma curta, individualmente, e depois trabalhei em cima do mesmo roteiro, mas com uma transformacao de energias: uma improvisacao comecava na libertina e terminava no desespero e a outra comecava na desilusao e terminava na romantica. Os mresultados também foram muito interessantes, porque uma energia, se bem utilizada, pode impulsionar o surgimento da outra de forma plena. De maneira geral, a primeira impro funcionou melhor que a segunda, até porque eu já estava próximo do final do ensaio e acabei correndo um pouco. Mas ficou claro que os paradoxos e as relacoes entre as quatro energias sao muito mais profundas e complexas do que eu tinha estabelecido a principio. o desespero, por exemplo, se conecta profundamente com a desilusao (como um centro impulsionador), m,as por outro lado apresenta contrastes interessantes com a romântica, porque uma vive o futuro e outra o passado.
O desespero, alias, ganhou contornos novos e mais profundos nessa semana. De alguma forma ele se descola da Else, mas eu nao vejo problemas obrigatoriamente nisso. Na quarta, a ideia da relacao sexual e o desespero conjuntamente trouxeram a volta de uma energia que hibernava há uns quatro anos, que eu tinha denominado de estupro. Nessa conexao, foi inevitável ver o ato sexual como algo repugnente, doloroso, contra a propria vontade. Na sexta, talvez influenciado por uma figura de Klimt que tinha visto por acaso pouco antes do ensaio (que anexo aqui) durante uma impro livre levei a mao à barriga, e me veio imediatamente a imagem de uma gravidez indesejada. Isso da mais uma nova perspectiva pra olhar essa energia, ela cada vez mais perde a imagem da menina oprimida por padroes sociais, e da uma dimensao mais profunda e grotesca pra essa opressao. Isso me agrada. Só como curiosidade, a obra de Klimt se chama A Esperanca...
domingo, 2 de março de 2008
Ensaios 27 e 29 de fevereiro
Redescobrir velhas sensacoes em sala de ensaio.
Voltar a encontrar o corpo, a escutar o corpo, a entender o funcionamento do corpo.
Ficar mais atento a suas vontades, a seus fluxos, a seus caminhos.
Nao tentar entender
Nao tentar entender antes da hora...
Sobretudo, planejar o mínimo possível...
Depois do ensaio de dia 20, entrei em uma pequena crise sobre minhas rotinas de trabalho. Percebi repentinamente que estava me tornando excessivamente racional em minhas estruturas de trabalho, excessivamente previsível, excessivamente lógico. Que nao estava dando espaco pro meu corpo respirar, que estav tao certo das coisas que andava buscando e dos caminhos para conquistá-las que já tinha pontos de chegada definidos antes mesmo de entrar em sala de ensaio. Curiosa consequencia da minha germanizacao? Talvez...
Mas me coloquei como objetivo de longo prazo transformar essa postura, ser mais atento, ser mais livre. Comecei com pequenas coisas. Ter uma divisao clara entre momentos de ensaio e preparacao/pausa. Me preocupar menos com o tempo de desenvolvimento de cada exercício, e mais com o tempo geral do ensaio, deixar que cada exercício se prolongue pelo tempo que o corpo achar necessário. Deixar que as coisas se transformem quando quiserem se transformar, trazer novamente o ator como peca fundamental e central do trabalho. As vezes acho que trouxe a racionalidade pro trabalho como uma forma de lutar contra uma tendencia de facilitacao do trabalho, que o fato de eu colocar objetivos e divisoes muito concretas e lógicas pro trabalho me obrigaria a desenvolve-lo dentro de certos padroes de existencia, independentes da minha vontade... Mas nao é bem assim que acabou acontecendo...
Na prática a semana foi marcada pela primeira exploracao das novas energias, a libertina e a desesperada. Como sempre, a primeira improvisacao (a de quarta) foi muito intensa, especialmente dentro das novas condicoes de trabalho que me coloquei. Se a energia do desespero é muito simples em si, pela própria condicao física que exige, a libertina anda num tênue fio entre a seducao implícita e a sensualidade explícita, tenho ainda um pouco de medo do ridiculo de expor uma sensualidade extremada, e acho que essa é a grande chava da energia. A improvisacao conjunta de quarta foi muito interessante, as duas energias se alimentara uma da outra e foram se intensificando após a improvisacao de maneira muito intensa.
Na sexta resolvi trabalhar um pouco mais profundamente com cada energia em separado (incluindo as da semana anterior), pois também tenho receio de que as energias só existam em dupla, preciso ter domínio delas o suficiente para fazer o uso que eu quiser, nao posso ficar atrelado a necessidades de combinacao para que as energias acontecam. A primeira energia foi a libertina, e foi um pouco dificil, tentei combiná-la com o tigre do ken-po, mas nao funcionou bem, também usei uma música que nao ajudou em nada, mas mesmo assim a energia aconteceu, ainda que nao tao intensa. O grande momento, pra mim, foi a segunda energia, a romantica, que era a mais fraca individualmente (acabou se tornando uma sublimacao da desilusao apenas) e na sexta aconteceu com grande intensidade sozinha. As outras duas energias também se desenvolveram bem, intensas, sem maiores surpresas e, como é de se imaginar, existe uma conexao muito forte entre o desespero e a desilusao.
Pra deixar registrado, encontrei a primeira referencia visual do processo: Klimt (austríaco, como Schnitzler, viveu mais ou menos na mesma época, também tem uma grande influencia da questao da sexualidade, da sensualidade adolescente, do uso e exposicao do corpo, e dentro de um universo poético que me interessa muito). Descobri um painel muito interessante, chamado Beethovenfries, que mescla de forma muito interessante a morte e a seducao...
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