quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Ensaio solitario de 20 de fevereiro

A energia propulsora da criacao.
A energia que bos leva a lugares inacreditáveis, inimagináveis, inconscientes. A energia que nos faz ir tao longe, que nos tira de nós mesmos, que nós faz ultrapassar nossas barreiras. Essa é a energia que me move no trabalho, que me impulsiona a entrar em sala de ensaio, a acordar a cada quarta e a cada sexta e ver sentido em ser performer solo, apesar da solidao e da dificuldade...

Como descobrir essa energia no nosso corpo? Como disponibilizar o corpo a produzir, ou a trazer a tona esse tipo de energia? Como explorá-la, aproveitá-la? Como dominá-la, transformá-la em acao, codificá-la? Como recuperá-la, deixar que ela se transforme, como mantê-la viva e primordial apesar da repeticao?

O ensaio de ontem foi pontuado dessas questoes. Uma terceira improvisacao sobre as energias AOLESCENTE (agora também chamada de ROMANTICA) e ADULTA (ou DESILUSAO). A retomada da desilusao, como era de se esperar, nao veio com a mesma intensidade da semana anterior. Nao me preocupo, sei que ela estava lá, o mesmo aconteceu outras vezes (com a VIUVA, por exemplo) e ela nao perdeu sua forca expressiva por causa disso. Mas uma pergunta ficou: Uma nova energia em improvisacao é sempre tao intensa porque ela nos surpreende e nos mostra um lado de nós mesmos que nós nao conheciamos (e consequentemente, sua retomada, mesmo que dotada da mesma qualidade de trabalho, nunca vai ser tao intensa, pois se trata da busca do conhecido)? Ou é apenas uma questao de plenitude, uma nova energia só surge porque estamos plenos, inconscientes, multifocados, e a sua retomada é um mero processo de um corpo minimamente consciente? O domínio de uma energia traz sua forma primaria de volta (e a resposta me vem com um enorme NAO, ela pode encontrar novamente sua intensidade, mas a partir do momento em que ela ganha forma e sentido ela se torna outra coisa, tem um outro grau de expressividade)

Estou filosofico. Deve ser um tipo de distracao porque ontem nao fui tomado, possuido, ontem possui, tomei, determinei o caminho. Estive consciente o tempo todo (com as vantagens e os problemas disso). Estive no comando. Pude perceber coisas com clareza, que me ajudam a definir algumas estruturas, ao mesmo tempo nao tive a intensidade de antes. É parte do processo. É o momento doloroso em que algo tao precioso se torna banal, pra que possa se transforma e encontrar um novo sentido. Nao acredito em teatro improvisado, ainda que trabalhe com frequencia com a idéia de improvisacao em cena. A energia primordial da criacao é tao fundamental quanto inscipiente. É um momento, nao um resultado. Mas os passos seguintes sao sempre dificeis, como se a cada vez eu tivesse que reaprender a andar.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Ensaios 13 e 15 de fevereiro

Voltar à velha disciplina. Reestabelecer as rotinas de trabalho. Definir a cada ensaio claramente objetivos a serem dominados, coisas a serem experimentadas. Nao esperar, nao depender de um estímulo externo que nao existe. Ter clareza sem perder a liberdade. Lembrar que mais importante do que o que se cria é porque se cria, que um bom conteudo independe da forma na qual ele é apresentado.
Essa foi uma boa semana de ensaios. As definicoes, as leituras e análises das últimas semanas surtiram um enorme efeito dentro do trabalho. A improvisacao desfocada de três semanas atrás parece hoje um passado distante. Agora eu já sei aonde estou indo e, ainda que o caminho pareca longo, é apenas uma questao de tempo até que eu posso trilhá-lo. Volto do ensaio otimista. Mexido. Transformado. Eu posso me envolver emocionalmente de forma profunda, mesmo sozinho em sala de trabalho. Houveram muitos momentos prazeirosos, com aquele frescor da primeira improvisacao, e também momentos de clareza dramaturgica, de desenvolvimento interno, de transformacao.
Para o trabalho dessa semana esolhi um dos pares paradoxais que determinei para Else, para me debrucar mais profundamente: A Adolescente e a Adulta. Na quarta feira a adolescente ficou mais forte, numa derivacao clara da forma como eu me propus a trabalhar, mas também por uma clara conexao entre ela e a energia original da donzela. A leveza que marca a segunda continua sendo uma caracteristica dominante, ainda que o olhar seja muito mais fantasioso e nao haja a idéia de um foco concreto para seducao. Alias, concretude é uma palavra que naocabe em relacao à adolescente. Tudo nela é abstrato, é fantasia, é sonho. Já hoje a adulta tomou corpo, forma, sentimento. No meio da improvisacao me veio a imagem de uma marquesa francesa caminhando rumo a guilhotina, tentando se manter neutra, intocada, apesar do turbilhao de coisas acontecendo dentro dela. Passar disso pra idéia do que aconteceria se Else realmente tivesse aceitado a proposta de Dorsday foi um pulo. A imagem dela, decepcionada, amargurada com a perspectiva de futuro que lhe resta, entrando no quarto e tentanto se manter absolutamente fria. Nao há desespero aparente, nao há nenhuma sensacao nos movimentos ou no irradiar do corpo. A tentantiva é de se manter fria, distante, como se isso fosse protegê-la da realidade. Como acao, surgiu uma sequencia simples mas interessante: sentada na cadeira, levanta, caminha um pouco, tira a blusa, se mostra para Dorsday, um giro completo, assume uma posicao pretensamente sensual (mas com energia neutra) e para nesse posicao. Depois volta a andar, ainda neutra, pega o casaco, veste o casaco e mai saindo, e só aí comeca a transparecer um nervosismo, que eu imagino seria o desencadear da energia pudica... Ainda fiz uma improvisacao com as duas energias combinadas, que teve momentos interessantes, mas ainda me parece um pouco inconsistente. De qualquer forma, as duas energias "nasceram", o que me leva agora a pensar se devo investir mais tempo nelas, para torna-las mais claras e definidas, ou se deveria tracar todas as energias e depois no jogo deixar que elas se clarifiquem?

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Semanas de febre e ócio

Duas semanas sem entrar em sala de ensaio.
Depois de um mês de pausa e apenas um ensaio relativamente conflituoso nada poderia ser pior.
Mas tive que aceitar o grito do meu corpo depois do treino, os 39 graus de febre, a dificuldade de conseguir sala e as crises existenciais como partes desse novo processo que estou comecando.
Amanha volto a trabalhar. Estou ansioso, mas ainda é confuso pra mim... Nao sei exatamente o que vou fazer em sala de ensaio. Aproveitei a semana pra reler o texto, refletir sobre ele, pensar novas estratégias de trabalho. Achei que nao fazia sentido abandonar o trabalho que vinha fazendo pra investir numa criacao de personagem, algo que nunca fiz, que nao sei como fazer, e que nao sei se consigo descobrir sozinho. Por isso decidi encontrar um outro caminho: procurar fragmentos claros de Else, e a partir deles buscar energias puras, julgando que a uniao dessas energias vai de alguma forma configurar uma Else pessoal, nao uma personagem do seculo XIX, e sim um reflexo do que ela seria em mim, no meu corpo - o que me parece um desenvolvimento mais lógico do que eu vinha fazendo ate aqui...
Um elemento que parece ser fundamental dentro dessa estratégia, e que dialoga diretamente com a maneira como eu penso e desenvolvo o meu trabalho, é a construcao de paradoxos. Dois me parecem essencias: um que eu denominei de ELSE ADOLESCENTE, que consttitui basicamente um olhar romantico sobre a existencia, um olhar esperancoso, basedao na ilusao de que alguém vai chegar a resolver os problemas pra ela contra uma ELSE ADULTA, que olha o mundo de forma objetiva e muitas vezes cínica, e sabe que ninguém vai salvá-la, sabe as consequencias dos seus atos, como um momento de tomada de consiencia dentro desse fluxo romantizado. Outro paradoxo claro é entre uma ELSE PUDICA, baseada na vergonha, nos valores sociais, na aparencia e na consequencia dos seus atos na maneira como o mundo olha pra ela contra uma ELSE LIBERTINA, que as vezes parece se divertir com o desenvolvimento da situacao, que gosta e quer ser desejada, que nao se importa, por momentos, com o olhar do mundo, mas apenas com seu próprio prazer. Por fim, há uma última else que me parece importante pra um primeiro desenvolvimento, que eu chamei de ELSE MORTA, que aparece nos momentos em que ela apresenta uma certa nostalgia pela morte, que ela diz que prefere morrer a ficar velha, na maneira como ela lida com o Veronal, e como ela fala com absoluta calma sobre a perspectiva de se matar. Poderia ainda se contrapor a ela uma ELSE VIVA, que aparece somente nos últimos momentos, quando ela já está a beira da morte, e que quer viver, que quer um pouco mais de tempo...
Montando, encontrando seis energias relacionadas a essas ELSES me parece ser possível estabelecer a personalidade multifacetada e compor uma personagem, sem abandonar as coisas nas quais eu acredito e ao mesmo temnpo dando conta da densidade do material literario.